Já na semana passada falei aqui nos comboios da CP e no género de personagens que por lá podem aparecer. Não vos falei ainda foi da mais insólita das figuras com quem um dia me cruzei num desses comboios. Resolvi chamar-lhe simplesmente PicaDealer, pelas razões que mais à frente irei expôr.
Os acontecimentos remontam ao tempo em que esta gaja que vos fala era ainda uma pobre estudante deslocada da UP, consequentemente, utente assídua dos tardios comboios que ligavam a cidade do Porto a Viana do Castelo. Numa dessas noites de viagem para Viana, particularmente pouco movimentada, entrei numa carruagem vazia, a prever a bela da soneca com a cabeça encostada à janela. Logo nos primeiros km do trajecto, reparo que o Pica do comboio vem em amena cavaqueira com um jovem. Param junto da porta da carruagem e assisto a uma pequena transacção comercial: jovem dá dinheiro ao Pica, Pica dá ao jovem, não um bilhete de comboio como seria de esperar, mas um pequeno saquito. Se dúvidas houvesse quanto ao conteúdo do saquito o jovem iria dissipá-las mais tarde, quando entrou no quarto de banho e saiu pouco depois acompanhado pelo cheiro óbvio de uma substância fumável ilícita.
Ora eu continuava aninhada no meu cantinho e fora do ângulo de visão do Pica. Só ao passar pelo corredor para a carruagem seguinte é que senhor me viu, tendo-se apercebido que eu tinha ficado a conhecer a actividade com a qual ele suplementava o orçamento familiar.
O Pica então pediu-me o bilhete, sorriu-me, sentou-se no banco ao lado do meu e disse:
- Sabe menina, nem tudo é o que parece!
- Hã não?- respondo eu - Não sei do que está a falar...
- Sabe, já muita gente foi fazer queixa de mim à CP, por eu ser uma pessoa assim... extrovertida!
- Sei, o senhor é extrovertido. Não se preocupe que não tenciono ir fazer queixa de si à CP.
- Ainda bem, é que eu tenho filhos para criar - disse o Pica, sacando da carteira, para comprovar a afirmação com a fotografia de duas criancinhas em idade escolar.
E assim começou a minha conversa com o PicaDealer, que tendo decidido que eu era uma gaja porreira, foi até Viana do Castelo a chatear-me com as suas teorias, sem me deixar prosseguir com a planeada soneca. É com pesar que vos digo que já não me recordo da maioria das teorias do PicaDealer. Uma das que mais gostei foi aquela em que o tipo dizia que, logo depois dos professores (?), os picas são a classe profissional que sofre mais com o adultério e em que a taxa de divórcios é mais elevada. "Anda a gente a percorrer o país de lés a lés e está a nossa mulher em casa com outro, é triste". Ossos do ofício, teria dito eu, mas achei melhor não desenvolver muito o assunto...
Na estação de Viana o Pica disse-me que era por causa das pessoas interessantes que se conheciam no comboio que valia a pena ser Pica e desejou-me uma boa vida. Tá bem, tá, Senhor Pica! Uma boa vida também para si...
Nota: para distinguir o PicaDealer dos restantes Picas, olhem para o pescoço do funcionário. Se tiver um colarzinho de missangas padrão cobra-coral, a imitar o Jim Morrison, saibam com certeza: é ele!
Os acontecimentos remontam ao tempo em que esta gaja que vos fala era ainda uma pobre estudante deslocada da UP, consequentemente, utente assídua dos tardios comboios que ligavam a cidade do Porto a Viana do Castelo. Numa dessas noites de viagem para Viana, particularmente pouco movimentada, entrei numa carruagem vazia, a prever a bela da soneca com a cabeça encostada à janela. Logo nos primeiros km do trajecto, reparo que o Pica do comboio vem em amena cavaqueira com um jovem. Param junto da porta da carruagem e assisto a uma pequena transacção comercial: jovem dá dinheiro ao Pica, Pica dá ao jovem, não um bilhete de comboio como seria de esperar, mas um pequeno saquito. Se dúvidas houvesse quanto ao conteúdo do saquito o jovem iria dissipá-las mais tarde, quando entrou no quarto de banho e saiu pouco depois acompanhado pelo cheiro óbvio de uma substância fumável ilícita.
Ora eu continuava aninhada no meu cantinho e fora do ângulo de visão do Pica. Só ao passar pelo corredor para a carruagem seguinte é que senhor me viu, tendo-se apercebido que eu tinha ficado a conhecer a actividade com a qual ele suplementava o orçamento familiar.
O Pica então pediu-me o bilhete, sorriu-me, sentou-se no banco ao lado do meu e disse:
- Sabe menina, nem tudo é o que parece!
- Hã não?- respondo eu - Não sei do que está a falar...
- Sabe, já muita gente foi fazer queixa de mim à CP, por eu ser uma pessoa assim... extrovertida!
- Sei, o senhor é extrovertido. Não se preocupe que não tenciono ir fazer queixa de si à CP.
- Ainda bem, é que eu tenho filhos para criar - disse o Pica, sacando da carteira, para comprovar a afirmação com a fotografia de duas criancinhas em idade escolar.
E assim começou a minha conversa com o PicaDealer, que tendo decidido que eu era uma gaja porreira, foi até Viana do Castelo a chatear-me com as suas teorias, sem me deixar prosseguir com a planeada soneca. É com pesar que vos digo que já não me recordo da maioria das teorias do PicaDealer. Uma das que mais gostei foi aquela em que o tipo dizia que, logo depois dos professores (?), os picas são a classe profissional que sofre mais com o adultério e em que a taxa de divórcios é mais elevada. "Anda a gente a percorrer o país de lés a lés e está a nossa mulher em casa com outro, é triste". Ossos do ofício, teria dito eu, mas achei melhor não desenvolver muito o assunto...
Na estação de Viana o Pica disse-me que era por causa das pessoas interessantes que se conheciam no comboio que valia a pena ser Pica e desejou-me uma boa vida. Tá bem, tá, Senhor Pica! Uma boa vida também para si...
Nota: para distinguir o PicaDealer dos restantes Picas, olhem para o pescoço do funcionário. Se tiver um colarzinho de missangas padrão cobra-coral, a imitar o Jim Morrison, saibam com certeza: é ele!
8 comentários:
Vá lá que surgiu inspiração para esta bela cena do quotidiano ferroviário.
Continue a ir, queroda Gaja, ao baú das memórias...
PicaDealer, Picadilly.
Há episódios que, sem dúvida, valem a pena ser contados!
Hilariante!
Ai querida gaja que história! Concordo com rps, continue a ir às suas memórias que deve ter muito para nos deliciar...
Qualquer dia começo a escrever um blog só sobre comboios... Ontem foram para aí uns 50 putos do infantário a cantar "bresca bresca, numa numa aiei...". Dai-me paciência...
Porque é que tudo o que é gente maluca e estranha gosta de andar de comboio à noite? Eu formulei esta questão há anos, baseada em centenas e centenas de viagens nocturnas (não nessa linha de que falou, evidentemente, mas sim na viagem Porto-Aveiro). Acredite que já vi de tudo, minha amiga, de tudo!
KKKidas,
Pois eu não tenho nada a dizer que da Foz até à baixa não há comboios. Eu sempre fui mais do tipo de andar de "cú tremido" no carro do papá! Isto classe é algo com que se nasce e não algo que se ganha de um dia para o outro... Ai, desculpem lá kkkidas eu estar assim tão azeda hoje... não sei o que me deu. Acho que tenho saudades de me divertir, deve ter sido por ontem, uma gaja nossa amiga me ter mostrado umas gajas espanholas na farra! Ora vejam lá vocês em http://i-am-bored.com/bored_link.cfm?link_id=14488
A mana tesoura
Eu não disse que a inspiração voltaria??!! Eu não disse?? Sou pequena mas percebo destas coisas!!!
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